terça-feira, 27 de novembro de 2007

Industria da beleza ou da escravidão? Um estudo de caso.

Idéias e esboços. Esse é um resumo básico do texto que eu esbocei pra um trabalho de fim de periodo da matéria Antropologia do Consumo da Faculidade. Muita vontade de desenvolver o tema. Um dia, quem sabe, talvez.


Tomando como premissa a indústria dos cosméticos, sobretudo voltada para o universo feminino ocidental e atrelando a ela uma análise - ainda que, de certo modo, em um nível mais incipiente - sobre o comportamento das mulheres na contemporaneidade, percebemos certas tendências axiológicas, vertentes dicotômicas e paradoxais: de um lado, baseadas no individualismo moderno em sua perspectiva mais extremada; a necessidade de uma construção da imagem do sujeito, que, no caso, é analisada através do consumo desses produtos de beleza, onde o que se procura é destacar-se da maioria, através de uma construção do “self” moderno característico e imanente às significações que cada indivíduo constrói e significa no uso, no caso, dos cosméticos. Por outro lado, percebe-se a tendência exarcebada à necessidade de tentar encaixar-se a padrões surreais de beleza, “impostos” pela mesma sociedade que cultua a estética padronizada como objetivo máximo de realização pessoal. Resumidamente, “seja bonita e resolva todos os seus problemas.”

Dentro dessas perspectivas, a análise do caso “Dove”, torna-se peculiar quando vê-se o clichê “Campanha pela Real Beleza Feminina”. Que “real beleza” seria essa? Até que ponto, essa campanha abarca os dois axiomas comentados?


Quando a marca Dove, lança uma campanha com o clichê “pela real beleza feminina”, está, ao mesmo tempo, contemplando os dois axiomas da contextualidade estético-corporal que perpassa o universo feminino atualmente. Ao mesmo tempo em que valoriza o indivíduo em si, padroniza, de certa forma, o tipo de beleza, afinal, a beleza em si já pressupõe padrões estéticos para que seja alcançada, ao passo que a feiúra não possui limites em seu horizonte.

É interessante ressaltar que de acordo com a empresa,

“O Projeto Real Beleza é uma iniciativa de responsabilidade social de Dove. Seu objetivo é fortalecer a auto-estima de crianças e adolescentes ao ampliar seu repertório sobre beleza, estimulando mudanças em suas atitudes para que se tornem adultos mais confiantes e preparados.”[1]

Aqui vemos diversos conceitos interessantes que devem ser analisados, mas que não cabem a esse estudo. Diante disso, realizarei apenas apontamentos lançam mais dúvidas do que trazem respostas, mas se tornam um importante exercício de reflexão. Primeiro, o fato do projeto ser considerado “responsabilidade social”. Um conceito relativamente novo, que atrela à empresa a responsabilidade não apenas com o meio ambiente, mas com a sociedade – poder público, a comunidade na qual opera – e, principalmente, com o consumidor. Mas porque a Dove resolveu realizar um projeto de responsabilidade social justamente com crianças e adolescentes? É sabido que essa parcela da sociedade é a mais “influenciável” até certo ponto, com o conceito de beleza inalcançável que todos os dias é massivamente martelado na mídia. Diversos casos de anorexia e bulimia, tentativas de suicídio e distúrbios psicológicos tem sido detectados em adolescentes e até crianças com menos de 12 anos. Dessa forma, penso que a empresa, a julgar pelo seu perfil de marketing, tenta atrelar a sua marca um sentimento de solicitude, de compreensão e apoio às dificuldades que atingem o público feminino quando o assunto é beleza. Dessa forma, nada mais cabível que realizar um projeto social que visa “educar” de certa forma, suas futuras consumidoras.

Diante de uma perspectiva de análise do consumo em si, nada mais óbvio dentro da “estrutura” desse – flexível e intersubjetiva – do que as categorias de dádiva e retribuição como base fundamental para as relações empresa-consumidor. Ao mesmo tempo que a empresa fornece o produto em troca do dinheiro do consumidor, a “dádiva” entre as duas partes vai além. Do consumidor, que deposita a sua crença na marca e no produto, querendo, em troca, resultados e satisfação pessoal. Da empresa, que espera, através de intensa propaganda e tentativas lançar produtos confiáveis no mercado, conseguir uma relação de fidelidade com o consumidor. A própria responsabilidade social também já é, em si, uma relação de dádiva, na qual a empresa se responsabiliza em dar um feedback para seus consumidores, através de uma série de projetos e tratamentos diferenciados. Dessa forma, cria-se um suposto vínculo social, uma relação pessoal entre consumidor e produto, entre cliente e marca, que tem se tornado o diferencial de marketing e de consumo em todo o mundo. O mercado tem se tornado cada vez mais exigente e modelos de padronização tayloristas já não “colam” mais entre a população que consome. A diversidade e a diferença talvez sejam as grandes bandeiras de lutas de todas as diversas minorias que compõe o mosaico social atual e que substituíram as grandes ideologias massificadas da sociedade moderna.


[1] Esse trecho foi extraído do site da empresa e explica qual seria a parte “empírica” do mesmo:

“esse projeto é composto por ateliês onde os alunos são estimulados a refletir e vivenciar os conceitos de beleza e auto-estima por meio de diferentes linguagens — artes corporais, plásticas e literárias. Cada aluno escolheu o ateliê do qual participa e tem um acompanhamento da sua evolução.”

Aqui, podemos perceber como a empresa procura incorporar conceitos de beleza estética e artística ao seu conceito de beleza comestológico. Há ainda um outro conceito, o de terapia, “auto-ajuda” que também é atrelado a marca da empresa, e pode ser observado em diversos produtos, que, ao contrário da maioria, prega um “tratamento à longo prazo”.



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